quinta-feira, 16 de julho de 2009

Projeto gráfico do livro Zazie no Metrô, da Cosac Naify





O primeiro toque provoca o leitor: as páginas são de papel bíblia que, dobrado, esconde cartazes da década de 1950. O texto é impresso com fontes tipográficas desenvolvidas também nessa época, quando Zazie no metrô foi lançado pela primeira vez, em 1959. O livro do francês Raymond Queneau completa 50 anos e ganhou sua primeira versão em português com a edição da Cosac Naify.

"A forma dialoga esteticamente com o conteúdo do livro", explica Elaine Ramos, editora de arte da Cosac Naify e responsável, junto com Maria Carolina Sampaio, pela concepção do projeto gráfico. O pano de fundo da narrativa, a Paris da década de 1950, deu as bases às quais o projeto gráfico buscou se enquadrar.

A transição constante entre a linguagem erudita e coloquial no texto de Queneau, por exemplo, influencia algumas escolhas do projeto, como a utilização de fragmentos de cartazes desenvolvidos por designers da alta cultura francesa - que, por sua vez, ficavam espalhados pelo espaço urbano e popular da Paris de 1950. A equipe de design selecionou cerca de 60 desses cartazes, que deram origem a 97 ilustrações utilizadas na publicação.

As páginas são formadas por um papel bíblia de 31 cm de comprimento e 21 cm de largura. Em um dos lados são impressas duas páginas consecutivas do livro, e no outro uma única ilustração. Quando encadernada, a peça é dobrada, deixando uma abertura na parte superior e outra na inferior da página. Pela transparência do papel bíblia, as imagens aparecem suavemente por trás dos textos.

Durante a leitura, enxergam-se algumas imagens coloridas no fundo, que são vistas com dificuldade. O único contato direto com as imagens que o leitor pode ter é pelos vãos superior e inferior.

A difícil identificação das ilustrações escondidas também foi pensada para ser polifônica e urbanística. Assim como Zazie caminha por Paris, o leitor a acompanha pela relação sinestésica proposta pela transparência das páginas, que permite uma visualização dos ruídos. "É como se houvesse um rumor da cidade por trás da narrativa", conclui Elaine.

No livro, a menina Zazie vai a Paris com o sonho de andar de metrô, e não consegue realizá-lo por causa de uma greve. O metrô se torna para a personagem o que as ilustrações são para o leitor: uma sublime fantasia, porque não se sabe o que é. Pode-se entrever os desenhos na publicação, mas não identificá-los de fato. "O grau de transparência do papel bíblia foi determinante na sua escolha", justifica Elaine.

imagens Cosac Naify
A equipe de designers selecionou cerca de 60 cartazes da Paris da década de 50, época quando se situa a narrativa. Os cartazes deram origem às 97 ilustrações utilizadas na publicação. Contudo, elas não são 100% visíveis: a proposta é reforçar a polifonia e a multiplicidade de referências simultâneas que a obra propõe
Até a escolha das fontes tipográficas foi relacionada ao período da narrativa. As editoras utilizaram fontes francesas que surgiram nessa época. Os títulos, páginas e capítulos foram impressos na fonte
Futura, pelo seu formato geométrico. Nas demarcações de capítulos, por exemplo, as únicas divisões do livro, os números estão em Futura e maiores, aludindo às letras de sinalização de trânsito. Para os textos, foi usada a Meridien, uma fonte considerada mais humana e suave.

Com retículas bem marcadas, as imagens foram impressas em duas cores: vermelho e azul. Em um único tinteiro, foram colocadas essas duas tintas em série, formando áreas de dégradé no resultado final. Todas as imagens começam vermelhas na cabeça do livro e terminam azuis no pé.

A imagem da capa foi produzida com fragmentos de um cartaz desenvolvido pelo designer Robert Massin em 1954. Embora a capa siga a mesma distribuição de cores e seja a única ilustração do livro que pode ser entendida de fato, os primeiros exemplares vêm com uma sobrecapa - também de papel bíblia - que, como uma dobradura, envolvem a capa e escondem, inclusive, o próprio rosto do livro.

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