terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Estúdios Terra, em Belo horizonte, se aproveita de declive natural do terreno, de Arquitetos Associados


Declive natural do terreno torna-se espaço habitável em edifício projetado por iniciativa de arquitetos e longe de incorporadores. Duas partes distintas conformam a obra, tanto em relação ao programa quanto à lógica construtiva
Por Simone Sayegh Fotos Eduardo Eckenfels

O programa e o terreno são completamente diferentes, mas a abordagem aproxima os Estúdios Terra 240 do projeto da Praça da Pampulha (também publicado nesta edição). Ambos em Belo Horizonte, saídos do mesmo escritório, Arquitetos Associados. Dessa vez os responsáveis pelo projeto foram Carlos Alberto Maciel e Bruno Santa Cecília. O Terra nasceu em 2006, e exportou conceitos para a Pampulha. Foi nos Estúdios que o tijolo se afirmou como opção construtiva - a primeira vez que os arquitetos empregaram o material foi em 1999, na Praça Milton Campos, em Betim, MG - que se desdobra intensamente na praça. Além disso, o aproveitamento da topografia, acidentada ou não, como condicionante ativa da arquitetura está presente nos dois projetos. No edifício, o declive natural do terreno torna-se espaço habitável enquanto que na praça cria-se o aclive, e se potencializa o uso. "Não é mera coincidência, a topografia é sempre fato gerador do projeto", explica Carlos Alberto.

O bairro escolhido para o edifício contribuiu para reforçar as particularidades do projeto, que quebra conceitos consagrados do mercado imobiliário. Santa Lúcia é resultado de um parcelamento dos anos 50, em região de topografia bastante acidentada. Diversas vias projetadas nunca foram implantadas pela inviabilidade topográfica, e segundo a Carta Geológica do Município várias características limitantes colocam a região em situação geológica de risco. Segundo os arquitetos, esse conjunto de restrições deslocou os interesses do mercado imobiliário para outros bairros, mas com o esgotamento do estoque de terrenos o bairro tornou-se a última grande área livre da região centro-sul de Belo Horizonte, apesar da infraestrutura deficiente. "O zoneamento na área permite baixo coeficiente de aproveitamento, o que faz com que o bairro apresente baixa densidade e maior porção de áreas verdes comparativamente a outros", completa.

Por ser um edifício corporativo, não na concepção total da palavra, há salas comerciais. Mas por ser fruto de uma iniciativa de arquitetos, e não de empreendedores imobiliários cujo programa é definido por corretores e incorporadores, exploram-se detalhes de ocupação pouco usuais. "O projeto não é uma reação a um programa pré-estabelecido, mas torna-se parte de um processo que vai da escolha do terreno, passando pelas definições de tipologia, projeto arquitetônico, coordenação e gerenciamento dos projetos complementares e da obra", explica Bruno. Para começar, as áreas de trabalho apropriam-se do declive, em oposição à ocupação com garagens e espaços residuais. O terreno apresentava aterros pré-existentes de até 8 metros, desafio aceito pelos arquitetos que ocuparam o declive em duas partes distintas em relação ao programa, à tipologia e à lógica construtiva.

O resultado formal do edifício é fonte dessas distinções, marcadas pelo escalonamento dos pavimentos, o que evitou a escavação e a construção de arrimos altos. O Terra divide-se em térreo com estacionamento, dois pavimentos inferiores e dois superiores. Em sua concepção original, previa uma maior ocupação do terreno e sete unidades comerciais no primeiro pavimento. Problemas durante a execução das fundações obrigaram os arquitetos a modificar o projeto com a obra em andamento.

Dessas alterações resultam a área aberta ao nível do terreno, a diminuição de duas unidades comerciais no primeiro pavimento e a adoção dos pilares em "V" para equilíbrio do volume superior em apenas dois pontos de apoio nas fundações.

Os dois pavimentos inferiores conformam escritórios em planta livre, com janelas horizontais tipo fita coerentes com a lógica construtiva da estrutura independente de concreto armado. Esses pavimentos são ocupados pelo escritório de arquitetura, com acesso independente. Já os dois pavimentos superiores abrigam cinco estúdios dúplex, pouco usuais para espaços comerciais, com sala e copa no pavimento inferior, mezanino e banheiro no nível superior.

"A localização das prumadas de água e esgoto permite diferentes usos para os estúdios, de maneira a liberar o restante do pavimento e do mezanino à ocupação livre", explica Bruno. Entre os dois volumes mais densos a arquitetura respira no espaço preenchido apenas pelos pilotis. A abertura para o público e urbano, tão necessária na talvez utópica busca pela integração, restringe-se apenas na pintura epóxi que desenha os grandes números que marcam as vagas de estacionamento.

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